A Caridade e a construção de uma sociedade mais justa
“Nestes tempos de “Lava Jato”
A caridade é sinal distintivo dos discípulos de Cristo – Jo 13,35. Jesus “nos ensina que a lei fundamental da perfeição humana e, portanto, da transformação do mundo, é o mandamento novo do amor – Jo 15,12”. O comportamento da pessoa é plenamente humano quando nasce do amor, manifesta o amor e é ordenado ao amor. Esta verdade vale também no âmbito social, político e econômico: é preciso que os cristãos sejam testemunhas profundamente convictas e saibam mostrar, com a sua vida, como o amor é a única força que pode guiar à perfeição pessoal e social e mover a história rumo ao bem – 1Cor 12,31.
O amor deve estar presente e penetrar todas as relações sociais: especialmente àqueles que têm o dever de prover o bem dos povos “alimentem em si e acendam nos outros, nos grandes e nos pequenos, a caridade, senhora e rainha de todas as virtudes” – DSI[1]. A salvação desejada deve ser principalmente fruto de uma grande efusão da caridade cristã que resume em si todo o Evangelho, e que, “sempre pronta a sacrificar-se pelo próximo, é o antídoto mais seguro contra o orgulho e o egoísmo do século” – DSI. Este amor chamado de “caridade social ou caridade política” deve ser estendido a todo o gênero humano.
O “amor” é o oposto do egoísmo e do individualismo: não se pode absolutizar a vida social numa visão exclusivamente sociológica, é preciso considerar que o desenvolvimento integral da pessoa e o crescimento social se condicionam reciprocamente. O egoísmo, portanto, é o pior inimigo de uma sociedade organizada: a história mostra a devastação produzida quando o homem não é capaz de reconhecer outro valor e outra realidade efetiva além dos bens materiais, cuja busca obsessiva sufoca e impede a sua capacidade de doar-se.
Para tornar a sociedade mais humana, mais digna da pessoa, é necessário revalorizar o amor na vida social — no plano político, econômico, cultural, fazendo dele a norma do agir. Se a justiça “é, em si mesma, apta para ‘servir de árbitro’ entre os homens na recíproca repartição justa dos bens materiais, o amor, pelo contrário, e somente o amor, é capaz de restituir o homem a si próprio” – DSI. Não se pode regular as relações humanas unicamente com a medida da justiça: “O cristão sabe que o amor é o motivo pelo qual Deus entra em relação com o homem; e é o amor também que Ele espera do homem como resposta. Por isso, o amor é a forma mais alta e mais nobre de relação dos seres humanos inclusive entre si. Consequentemente, o amor deverá animar todos os setores da vida humana, estendendo-se também à ordem internacional. Só uma humanidade onde reine a ‘civilização do amor’ poderá gozar de uma paz autêntica e duradoura” – S. João Paulo II.
Só o amor pode transformar completamente o homem. Semelhante transformação não significa anulação da dimensão terrena numa espiritualidade desencarnada. Quem crê poder conformar-se com a virtude sobrenatural do amor sem levar em conta o seu correspondente fundamento natural, que inclui os deveres de justiça, engana-se a si mesmo: a caridade representa o maior mandamento social. Respeita o outro e seus direitos. Exige a prática da justiça, e só ela nos torna capazes de praticá-la. Inspira uma vida de autodoação: “Quem procurar ganhar sua vida vai perdê-la, e quem a perder vai conservá-la” – Lc 17,33. Tampouco pode a caridade esgotar-se unicamente na dimensão terrena das relações humanas e das relações sociais, porque toda a sua eficácia deriva da referência a Deus.
[1] DSI – Doutrina Social da Igreja – Compêndio da Doutrina Social da Igreja, Edições Paulinas – 2005.