As Comunidades Eclesiais de Renovação – CERs
- a) Comunidades Eclesiais de Renovação – uma experiência de ser Igreja
A CER representa a forma organizada da vivência fraterna que se propõe realizar a filiação divina juntamente com a missão no mundo. O caráter comunitário consiste num modo de conviver humano tal que, em vista de um número mais reduzido de seus membros, faculta o aprofundamento pessoal de seu inter-relacionamento, de par com o enriquecimento individual. Além disse, a CER atribui aos seus lideres uma função ministerial, estribada sobre a solidariedade mútua; finalmente a CR entende-se a si mesma como fermento no seio da comunidade maior e da sociedade.
Nas CERs temos aquela Igreja doméstica conhecida desde os inícios do cristianismo, edificada sobre os alicerces da comunidade familiar. Impelida para o isolamento e limitada forçosamente a suas funções biológicas, a família já não pode corresponder à sua tarefa evangelizadora que desempenhava inicialmente na Igreja (Puebla, 571-581). Dai advém o apelo irresistível de evadir-se do anonimato da massa para criar novas formas de vida familiar cristãs e idôneas de comunicar a fé, de tomar iniciativas, dando sentido e transformando a sociedade. No nível da família, as CRs dão expressão concreta aos anseios de maior autenticidade vivida.
A razão de ser das CERs não é tanto a situação social atual, quanto justamente a necessidade de uma vivência cristã concreta que não tem sido possível na estrutura eclesiástica tradicional inepta ante as novas exigências.
A escassez crescente de sacerdotes provoca ativação sempre maior dos leigos para fazer frente à tendência retrógrada da assistência pastoral.
Já no Projeto Pastoral de 1.966, os Bispos do Brasil escreveram :
“Faz-se urgente uma descentralização da paróquia, não necessariamente no sentido de criar novas paróquias jurídicas, mas de suscitar e dinamizar, dentro do território paroquial, comunidades eclesiais (base) (como as capelas rurais) onde os cristãos não sejam pessoas anônimas que apenas buscam um serviço ou cumprem uma obrigação, mas sintam-se acolhidas e responsáveis, e delas façam parte integrante, em comunhão de vida com Cristo e com todos os seus irmãos” (CNBB – Pastoral de conjunto).
No tocante a si mesma, a CER entende-se como Igreja no sentido exato do termo. Unida genuinamente ao ministério hierárquico, os fiéis tomam a sério sua participação na missão da Igreja, envidam esforços por colocar, em igualdade e fraternidade, a sua vida a serviço de todos, não se considerando como grupo de elite, na convicção de que o caminho para que o Reino de Deus esteja em nosso meio só pode ser através do engajamento cristão.
- b) Entretanto, em que sentido exato as CERs são Igreja?
A garantia da união da Igreja consiste na fé, nos sacramentos e no cargo do pastoreio. O seu ponto de partida é Jesus Cristo que convoca para a fé, facilita a comunhão vertical com Deus, ao lado da fraternidade horizontal.
Ora, as CERs vivem a convicção da comunhão com o Cristo, com o Pai e com o Espírito Santo. A oração e a reflexão em comum sobre a Palavra de Deus aprofunda a identificação com o homem Jesus de Nazaré, comprovado como Filho de Deus e vencedor do Maligno pela sua vida, mormente na sua morte e ressurreição.
Na tensão conflitiva da vida diária, a CER experimenta o Ressuscitado em sua pessoa e em sua comunhão. Cristo está vivo no meio de seu povo e na sua vida oferece os critérios práticos para a vida cristã no mundo.
A fé é celebrada na Palavra e no sacramento. Alegrias, esperanças, tribulações, sucessos ou derrotas, qualquer evento da vida real, pela comemoração do mistério da ressurreição do Cristo, transforma-se em identificação do homem com Deus.
Na eucaristia, a CER celebra o ápice de sua experiência comunitária e união com a Igreja. A recepção dos sacramentos já não é o cumprimento de um dever cristão, e sim parte integrante da vida cotidiana.
A criatividade da fé posta em prática produz gestos de celebrações que partem da vida da própria CER. Assim sendo, o Grupo de Oração, os “Cercos de Jericó”, os Dias de Louvor, os Grupos de Perseverança, os Grupos de Intercessão, a Escola de Formação, a devoção mariana, são elementos eloqüentes da união profunda entre religião e vida que já antecipam, na liturgia, na oração, na vivência fraterna, a salvação total do homem.
A catolicidade da Igreja está nas CERs em evidência na proclamação universal do Reino de Deus para aqueles que ainda não foram atingidos pela ação evangelizadora da Igreja em sus formas tradicionais de pastoral paroquial. É aquela massa não atingida pela pregação ordenada por Cristo (Mt 28,18-20), que agora tem acesso à Palavra de Deus e a realidade salvífica; agora recebe uma vida eclesial visível por intermédio das CERs, anuncia-se-lhe a boa-nova do Amor de Deus.
A todos vem sendo oferecido o Reino de Deus com a exigência de conversão para os valores do Evangelho. Vivendo concretamente uma experiência de Igreja, a CER aproxima-se também dos que não têm religião ou coisa que o valha, porquanto a fé católica não é anunciada como um curso de doutrina, e sim na sua experiência de Deus pela ação do Espírito Santo.
A apostolicidade da CER lembra vivamente a comunidade primitiva que interpretava, como Povo de Deus escatológico-messiânico, aquela assembléia simbólica constituída por obra dos Doze. A congregação sabe-se herdeira da tradição apostólica, convocada por Cristo para a sua missão no mundo e incumbida pelo respectivo pastor. É que a sucessão apostólica não se reporta apenas ao número insignificante dos hierarcas, mas abrange eclesialmente todo o Povo de Deus, discriminando-se no seio da Igreja os vários ministérios e deveres.
A CER é uma componente integral do Corpo da Igreja cuja cabeça é o Cristo, e se desincumbe de suas tarefas juntamente com a Igreja local e suas diretrizes pastorais, proporciona espaço eclesial para o desabrochamento legitimo dos variados carismas dos fiéis.
Autor: Tácito Coutinho – Tatá – Moderador do Conselho da Comunidade Javé Nissi