As Comunidades Eclesiais: A Comunidade Paroquial
À semelhança das CERS, a Igreja local (paróquia) não é parcela da Igreja no sentido exato do termo; trata-se antes de modalidade organizatória da Igreja particular com o objetivo de melhor satisfazer às tarefas pastorais. Sob este prisma de sua origem (Pastor, histórico da paróquia, in Paróquia), a paróquia cuidava de três encargos: administração do batismo, celebração da eucaristia e assistência aos indigentes. O âmbito de sua competência dependia da densidade populacional. Crescendo a influência do sistema feudal, a paróquia também adotava traços feudalistas expressos na circunscrição territorial de sua jurisdição, nos bens materiais e na administração dos bens espirituais necessários para a salvação (sacramentos e sacramentais).
Um dos distintivos da paróquia é a centralização da administração dos sacramentos, a insistência sobre o múnus presbiteral e a sua jurisdição delegada da parte do bispo, pelo em que o pároco funcionava como intermediário entre bispo e povo, sendo este delimitado territorialmente a um só lugar de administração da salvação e da atividade religiosa, cabendo-lhe papel assaz passivo. A finalidade da organização era abarcar, em nome da religião, o Povo de Deus dentro da estrutura patriarcal e do sistema feudal de produção para santificar-lhe a vida apostolicamente. Esta finalidade era atingida realmente durante séculos em seguida (CNBB Sul I, Pastoral).
Atualmente, não são apenas teólogos, mas também documentos eclesiásticos (CNBB, Quarto Plano Bienal) que abordam a grave crise deste modelo pastoral: “Em nossa pátria, por causa da vasta extensão das paróquias e escassez de clero e pouca influência da renovação eclesial, propiciada pelo Concilio de Trento, além de outros fatores tais como a originalidade da formação de nossas cidades e dos métodos de evangelização nelas empregados, a paróquia viu-se enfraquecida na eficácia da ação evangelizadora, apresentando deficiências que progressivamente foram se agravando, atingindo uma fase mais crítica no período da atual caminhada da Igreja… Este sistema tem funcionado com certa eficácia nas cidades pequenas e médias, segundo cada região. Entretanto, o atual fenômeno da urbanização com suas características próprias não deixa de questionar a estrutura e o sistema paroquiais.” (CNBB Sul I, Pastoral)
O homem urbano já vive num ambiente social abrangente de todas as áreas de sua vida. As múltiplas implicâncias sociais asseguram ao individuo as mais variadas opções capazes de lhe estimular a liberdade pessoal. A paróquia tradicional, comprovada como instância controladora e totalitária, é rejeitada instintivamente. Em seu lugar, o homem busca outros agrupamentos e comunidades para fazer frente à quantidade das possíveis realizações. “Portanto precisamos prever para o futuro vários tipos de laços comunitários e vários tipos de pertença à Igreja por meio da pertença aos grupos. Cada pertença será limitada, cada comunidade será especializada e capacitada para responder a um tipo de necessidades cristãs. A harmonia na multiplicidade fará a configuração da Igreja de amanhã”. (Comblin, Pastoral Urbana)
A paróquia funciona como elo de ligação entre as diversas Comunidades – entre elas a CERs – e outros grupos especializados; ela é a “rede das comunidades”.(CNBB, Doc 54)
Nesta perspectiva a tarefa pastoral da paróquia coincide com a missão dos fiéis, que participam na vida paroquial pela sua atuação e iniciativa. Frutos do Espírito de Deus, os mais variados carismas e ministérios do Povo de Deus ficam englobados para a construção da comunidade em união e solidariedade. Quanto ao pároco, está a serviço desta coordenação de sua comunidade pluriforme, no papel de “irmão mais velho” (Marins, Metodologia) da grande família, que confirma seus irmãos na fé e com ela celebra o mistério da encarnação e ressurreição de Jesus Cristo.
A paróquia realiza uma função de Igreja em certo sentido integral, já que acompanha as pessoas e famílias no decorrer de toda a sua existência, na educação e crescimento na fé. É centro de coordenação e animação de comunidades, grupos e movimentos. Aqui, amplia-se mais o horizonte de comunhão e participação. A celebração da eucaristia e demais sacramentos torna presente de maneira mais clara a totalidade da Igreja. (cf Puebla 644)
O critério territorial conserva a sua legitimidade por ser a “igreja” o ponto de convergência das comunidades, dos líderes e dos ministros hierárquicos. Ao seu lado está surgindo o princípio pessoal que congrega uma comunidade paroquial portadora dos interesses e objetivos comuns, independentemente da residência de cada um. A paróquia transforma-se então numa “rede de interesses comuns” (cf CNBB Doc 54) que abriga espontaneamente aquelas pessoas cujas aspirações religiosas combinam com este ou aquele grupo. Estes agrupamentos necessitam da função integrante da paróquia, a fim de que seja renovada a sua dimensão apostólica e missão missionária no seio da Igreja, e orientada em vista da vida total da Igreja. Sem essa precaução, os ditos grupos cairiam inevitavelmente no perigo do isolamento e do fechamento.
Entre os encargos mais urgentes sobressai a promoção das comunidades no intuito da tarefa especial e do exercício de seus carismas, bem como da formação de lideranças idôneas e indispensáveis para um apostolado leigo harmonioso. É preciso que haja mais coragem para aumentar os esforços na formação de líderes e pela ampliação dos espaços, bem como espaços próprios (Casas de Formação) para as CERs manterem seus serviços e atividades, sem se ausentarem da comunhão paroquial.
Autor: Tácito Coutinho – Tatá – Moderador do Conselho da Comunidade Javé Nissi