EM-VE-LHE-SER?
“O cabelo grisalho é uma coroa de esplendor e se obtém mediante uma vida justa” (Provérbios 16,31)
Presos ao relógio, corremos contra o tempo para que todos os compromissos assumidos no dia sejam cumpridos. As crianças, mesmo sem estabelecer uma lógica sobre o tempo, já se encarregam de agilizar para chegar a tempo nos compromissos estabelecidos por seus pais. A vida tornou-se uma corrida contra o tempo! E nesta corrida, quem percebe o envelhecer?
O envelhecimento traz alterações biológicas, psicológicas e sociais e deve ser entendido como a deterioração da energia vital ao longo do tempo, em decorrência da passagem do tempo.
Estamos em um mundo cada vez mais velho, ou seja, aumentou o número de idosos e diminuiu consideravelmente o número de nascimentos e o Brasil está entre os países com maior número de idosos. Diante dessa constatação, como é conviver com as mudanças? E, como olhar o envelhecer-se?
Envelhecer, ou seja, ‘Em ver-lhe-Ser’?
Nascemos e quando começamos a falar começam a nos tratar não mais como bebês, mas como crianças. Ao concluirmos o quinto ano escolar, tratam-nos como adolescentes e não são aceitos comportamentos infantis e adultos. A medida que terminamos os estudos e conseguimos um trabalho, já temos uma porção de responsabilidades e somos considerados adultos. Para cumprir todas essas fases, ocupamos sempre um papel em um determinado espaço na sociedade. Na vida adulta, este espaço fica muito marcado por um longo período de tempo, e quando nos adaptados a ele, vamos envelhecendo e um novo espaço é demarcado.
Sabemos que o inconsciente é atemporal, ou melhor, não envelhece, mas, sabemos que o envelhecimento traz uma perda da plasticidade e resistência a mudanças que muitas vezes é percebida como ansiedade.
Envelhecer, ou seja ‘olhar-o-ser’?
É uma fase singular, onde nosso olhar pode e deve estar voltado mais a si próprio que ao externo. Época de valorizar com maior intensidade os momentos vivenciados, as amizades, a família. Tempo de embutir afeto e discernimento nas relações e atitudes.
Na nossa sociedade há um ‘culto’ pela beleza e pela juventude: a preocupação excessiva com a aparência – corpos malhados, pesquisas em torno da alimentação, shakes, medicamentos, cirurgias, pomadas, enfim, uma parafernália antienvelhecimento. Pouco se fala do envelhecer, que independente dos cuidados, vai chegar e nele a mais bela lição: a sabedoria.
Investir na aceitação pela vida que tiveram adquirindo integridade do ser e conter o desespero pela vida que não poderá ser vivida novamente, o idoso é um eterno convidado do tempo e dos acontecimentos (perdas, mudanças físicas, doenças) a avaliar sua vida e, portanto, aceitá-la com carinho e respeito por si mesmo. A aceitação faz que o tempo seja vivido de forma coerente, com alegria, dinamismo, energia, motivação, e que as ações cotidianas sejam experimentadas com sabedoria.
Para envelhecer com integridade, cuidar de si remete a aceitação de que os anos são sempre vistos com alegria por aqueles que nos rodeiam. A idade traz a oportunidade de um movimento interior de rever a própria vida e aprender com ela. O ‘envelheSer’ faz parte da humanidade e as mudanças de papéis sociais em decorrente deste processo permite-nos novos anseios, experimentar emoções lapidadas por toda uma vida, torna-nos mais coerentes, com mudanças positivas, as mudanças biológicas tornam-se apenas detalhes.
Autor: Lú Cazaroto – Psicóloga – Comunidade Javé Nissi