Missão da Igreja – Missão de Cristo
Uma leitura dos capítulos 3 e 4 dos Atos dos Apóstolos
Pedro e João subiam ao templo para orar (1). Chama-nos a atenção, pois esta perícope é análoga ao do bom Samaritano (Lc 10,30-37), parábola peculiar de Lucas. Contudo, a narrativa nos Atos dos Apóstolos traz em seu bojo um diferencial que chamamos batismo no Espírito Santo ou experiência de Pentecostes. Na parábola do Samaritano o ritualismo ocupou o lugar da caridade, na experiência dos discípulos a caridade é que dá sentido ao rito!
A ação do Espírito nos apóstolos produziu nos discípulos uma caridade, própria de Deus, pois em Jesus Cristo palavra e obras caminham juntas. O Evangelho é boa nova de “poder = δυναμις – dinamis”, isto é, transformadora de vida!
Se o referido texto se ocupasse apenas da perspectiva da cura física seria muito pobre, neste caso, talvez pobre seja nossa interpretação! Na vertente dos textos bíblicos jorra a força da cultura hebraica, daí a riqueza dos simbolismos:
Templo = casa, presença de Deus – O coxo de 40 anos = uma geração – Ouro e prata = pobreza da autossuficiência humana – Nome de Jesus = riqueza do poder de Deus – Igreja perseguida = Igreja ORANTE etc.
Disto isto, consideramos que o coxo vivia na esperança da esmola, não contava com a boa nova de Jesus Cristo! Mais do que uma simples cura Jesus restaurou lhe a dignidade perdida e desacreditada, pois o dado apresentado por Lucas de que o coxo tinha 40 anos, isto é, uma geração! Na linguagem popular seria o mesmo que dizer: “esse cara já deu o que tinha de dar”.
Ao curá-lo, Jesus o insere no relacionamento com Deus (templo – 3,8), no convívio com a sociedade libertando-o da mendicância, da inferioridade e desigualdade. Da boca de Pedro se ouve: “Ouro e prata não tenho” – parece não ser verdade esta afirmativa, ou no mínimo desnecessária a referencia, pois era de práxis dar uma moeda para entrar no templo. Ao colocar esse discurso na boca de Pedro e João, Lucas quis ressaltar a força do querigma (3,11-26), que contrapondo os valores da época, mostra qual o único meio para restabelecer a dignidade dos seres humanos (4,12).
Assim, nesta narrativa Lucas está construindo os parâmetros da ação evangelizadora da Igreja, cujo conteúdo central de seu anúncio é Jesus Cristo e o fruto primeiro é o restabelecimento da dignidade do ser humano (3,8). A consequência é a admiração e a perseguição!
A narrativa se encerra com chave de ouro ao mostrar uma Igreja ousada, destemida e pneumática que batizada no Espírito Santo testemunha fervorosamente a graça sanadora de Deus para todos que se abrem ao seu amor (4,23-31).
Esta é a Igreja nos tempos de Francisco: “Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à evangelização do mundo atual que à autopreservação”. Uma Igreja em saída (EG 25).
Autor: Carlinhos Faria – Teólogo – Membro da Comunidade Javé Nissi